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Tráfico de escravos (1877 a 1886) - Parte I 6m5d5x

Editor: Lúcio Flávio Pinto - Miguel Oliveira/Redator interino - 27/04/2025

Pintura que retrata jovem cativa realizando o serviço de pegar água do rio e levar para a casa de seus senhores - Créditos: Fonte: CHAMPNEY, James Wells. Travels in the north of Brazil. Álbum, 1860

 

 

 

Luiz Carlos Laurinho, docente do curso de História da Universidade Federal do Oeste do Pará, doutorando do Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade de São Paulo, se dedicou a consultar os livros de registros de transações mercantis, no município de Santarém, do Cartório Nogueira Sirotheau, para pesquisar os fluxos de entrada e saída do tráfico de escravos durante o período delimitado na documentação utilizada, de 1877 a 1886.

 

Laurinho conta “a história do escravo João, vendido em abril de 1879 por 1 conto de réis por Anna Francisca Pereira (de Santarém), sua senhora, a Américo de Oliveira Lima (de Itaituba), é um exemplo. Carafuz, com 27 anos, natural de Santarém, casado com Florência (mulher livre), embora tenha sido caracterizado como doméstico, trabalhava no Alto Tapajós na fabricação de borracha no momento de sua venda”.

 

O pesquisador explica também que “aparecem com alguma expressão os escravos lavradores, vaqueiros e sem ofício específico. Os dois primeiros casos estão ligados à importância da agricultura e criação de gado na região, atividades que absorviam grande parte da força de trabalho escrava. Os escravos sem ofício, por outro lado, poderiam ser escravos utilizados de múltiplas formas e em uma gama variada de funções (o que não significa que o mesmo não acontecia com escravos de ofício definido). Essa categoria corresponde a 6,25% dos escravos vendidos, que, somados aos 15 escravos cujo ofício não foi informado, possivelmente também empregados em vários lugares e funções, atingem o percentual de 25%.”

 

O resultado da pesquisa revela a  “ filtragem dos escravos segundo a ocupação/qualificação profissional e o sexo traz à tona um conjunto de funções e ofícios exercidos exclusivamente por homens, outro por mulheres; apenas entre os escravos cujo ofício não foi informado, os lavradores, serventes e mais equilibradamente os domésticos havia tanto homens quanto mulheres.’

 

Santarém

 

A pesquisa de Laurinho destaca a importância do comércio de escravos em Santarém:

 

“No Pará, durante as décadas de 1870/80, destacou-se o tráfico local e intraprovincial. A ampla maioria das vendas de escravos registradas no Cartório Sirotheau tinha como ponto de partida e destino Santarém, o que se explica, em grande medida, pelo fato do cartório estar nele situado, mas também pela importância do seu mercado de escravos. 59 dos 79 escravos vendidos – seja no âmbito do Baixo Amazonas, da província ou em rotas interprovinciais – eram de senhores com residência neste município. Dos demais 20 escravos, 15 foram comprados por senhores de Santarém, tendo os senhores aí residentes comprado, ao todo, 62 dos escravos vendidos. Os vendedores e compradores dos 5 escravos traficados em rotas externas a Santarém, ou seja, que não envolveram senhores desse município, ali registraram seus negócios provavelmente por se tratar do principal entreposto comercial da região à época.”

 

A pesquisa leva em conta Santarém como fronteira com a província do Amazonas (criada em 1850) e pela importância do rio Tapajós como via de conexão com a província do Mato Grosso:

 

“A região do Baixo Amazonas é situada em torno da foz do Rio Tapajós, noroeste do atual Estado do Pará, lugar historicamente ocupado por diversos grupos indígenas. No século XVII, começou a ser colonizada pelos portugueses, processo intensificado no período pombalino, momento em que a força de trabalho escrava de origem africana começou a ser ali inserida em maiores proporções. No século XIX, sua localização se tornou estratégica, pois perto da fronteira com a província do Amazonas (criada em 1850) e pela importância do rio Tapajós como via de conexão com a província do Mato Grosso. Na década de 1870, abrangia essencialmente sete municipalidades (Monte Alegre, Santarém, Vila Franca, Itaituba, Alenquer, Óbidos e Faro) e sua economia girava em torno da criação de gado, comercializado no mercado interno, e da produção e exportação de cacau e borracha.”

 

Com base em documentação cartorial e paroquial de Santarém, Óbidos e Alenquer, outro pesquisador - Eurípedes Funes- apresentou algumas características gerais da escravidão na região: “a maioria dos africanos para ela traficados era do sudoeste e centro da África; no século XIX, predominaram plantéis de poucos escravos, o que favoreceu a convivência próxima entre senhores e escravos; como em outras partes do império, os escravos contavam com certa margem de negociação e espaços de autonomia. Naquele quadrante, as diferentes facetas da experiência dos escravos (como o trabalho, a sociabilidade, a resistência) eram permeadas pelo contato interétnico e influenciadas pelo meio ambiente.

 

(Continua na próxima edição)




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