UFOPA mapeia 619 árvores em seu campus com potencial para parque urbano 2k347
Vista aérea do campus Tapajós da UFOPA, em Santarém -
Créditos: Divulgação/Arquivo/UFOPA
No coração de Santarém, um grupo de estudantes do curso de Engenharia Florestal da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) realizou o inventário completo das árvores do campus universitário. Foram identificadas 619 árvores de 87 espécies diferentes, distribuídas ao longo de mais de 11 hectares. Trata-se de uma área verde estratégica, situada em uma das regiões mais antigas e históricas da cidade. Ao lado do campus, há sítios arqueológicos que testemunham ocupações milenares da floresta.
A espécie mais presente no campus é o Ipê Amarelo, com 95 indivíduos. Em seguida vêm o Breu Preto (75), a Aroeira do Sertão (42) e o Marupá (38). O campus abriga ainda três Samaúmas centenárias, que ultraam os 35 metros de altura. Espécies amazônicas de grande porte, como a Itaúba, o Pequiá e a Copaíba, com sua imponência e valor ecológico, reforçam a riqueza ainda preservada no centro urbano de Santarém.
Apesar de ainda não contar com uma horta coletiva mantida por estudantes e professores, o campus possui um pomar com 45 frutíferas. São 12 mangueiras, 13 cajueiros, 10 araçazeiros, 2 goiabeiras e 8 murucizeiros. A frutífera de maior porte — uma mangueira com 127 cm de diâmetro e 400 cm de circunferência — impressiona não apenas pelo tamanho, mas pelo que representa: árvores que alimentam, refrescam e criam pertencimento.
A iniciativa vai além da identificação botânica. Também foi realizado o mapeamento das árvores com potencial risco de queda. Dezoito delas apresentam troncos ocos, incluindo dois Jatobás e um Matamatá Preto. Quatro estão mortas, sendo duas Tatapiricas, um Araçazeiro e uma espécie ainda não identificada. Outras três aguardam avaliação técnica. Com base nesse levantamento, a Superintendência de Infraestrutura (SINFRA) poderá realizar o monitoramento contínuo e intervenções preventivas, como podas e remoções controladas.
Além de sua função acadêmica, um campus arborizado deve cumprir, segundo boas práticas internacionais, o papel de espaço aberto à população. A presença de espécies nativas, árvores monumentais e frutíferas atrativas dá à UFOPA o potencial de se tornar um ponto de ecoturismo urbano. É um lugar onde turistas e moradores podem aprender, respirar e se reconectar com a floresta.
Esses dados evidenciam a urgência de uma política pública que reconheça, valorize e amplie as áreas verdes da cidade. Santarém perde vegetação urbana a cada ano. Esse inventário chama atenção para o papel que a universidade pode exercer como modelo de resiliência ecológica, educacional e alimentar.
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Tanques de petróleo: entre a universidade e os conflitos socioambientais u5pf
Hoje, o contraste entre o complexo portuário do agronegócio — encabeçado pelo porto da Cargill — e o campus da UFOPA, espaço de formação, pesquisa e cuidado com o território, evidencia dois projetos de cidade que disputam o futuro da Amazônia: um voltado ao lucro de poucos, outro ao bem comum.
Foi em 2003, no entorno do que hoje é o campus Tapajós da UFOPA — à época, sede do Núcleo de Tecnologia da Madeira, vinculado à Universidade Federal do Pará (UFPA) — que a multinacional estadunidense Cargill instalou seu porto graneleiro e seus silos de soja. A instalação ocorreu sem a realização de estudos de impacto ambiental completos. O Ministério Público Federal e movimentos sociais denunciaram a ilegalidade da obra, já que parte do sítio arqueológico Tapajós foi destruída para viabilizar a construção. Reconhecido como lugar sagrado por povos indígenas da região, o sítio guardava registros milenares de ocupação humana na confluência dos rios Tapajós e Amazonas. Mesmo assim, a obra foi adiante.
Além disso, o terminal da Petróleo Sabbá–Raízen, com tanques de armazenamento de derivados de petróleo, fica hoje a apenas 18 metros das salas de aula da universidade. Uma fina cortina de vegetação camufla a proximidade da zona de perigo — um risco real, considerando que instalações desse tipo são suscetíveis a vazamentos, incêndios e explosões. Em 2015, por exemplo, um incêndio em tanques de combustível no Porto de Santos durou nove dias, provocando a contaminação do ar, da água e a morte de milhares de peixes. A presença de um terminal de combustíveis tão próximo a uma instituição de ensino superior escancara a falta de planejamento urbano e a ausência de critérios mínimos de zoneamento ambiental.
Movimentos como o Tapajós Vivo e organizações como a Terra de Direitos seguem denunciando os impactos de empreendimento da zona portuária na área urbana de Santarém alertando sobre impactos na saúde pública, no patrimônio cultural e no ecossistema. Projetado para escoar a produção de soja que avança sobre a floresta, o porto da Cargill tornou-se símbolo da desordem urbana e dos conflitos socioambientais que marcam Santarém até hoje.
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Um parque universitário? 1o54f
O campus da UFOPA, com seus mais de 11 hectares — sendo cerca de 2 hectares de vegetação nativa preservada — tem área equivalente, e até superior, à de muitos parques urbanos consagrados em grandes cidades brasileiras. Em São Paulo, por exemplo, o Parque Trianon ocupa apenas 4,8 hectares; já o Parque da Água Branca, 13 hectares. Isso dá ao campus o porte de um parque urbano de médio porte, com vegetação nativa, árvores centenárias e espécies frutíferas que oferecem sombra, alimento e conexão com a floresta viva.
Segundo o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), é dever dos municípios garantir o o à terra urbana com qualidade de vida e promover a proteção ambiental como parte do desenvolvimento sustentável. Já os Planos Diretores devem prever e proteger espaços livres de uso público, como áreas verdes.
Em Santarém — cidade que, como outros centros urbanos da Amazônia, vive um processo acelerado e desordenado de expansão imobiliária — o campus da UFOPA se destaca como um dos últimos remanescentes contínuos de vegetação na malha urbana central. Segundo estudo de Souza e Monteiro (2019), a urbanização da cidade entre 2007 e 2017 avançou de forma fragmentada, consumindo áreas verdes e pressionando os ecossistemas urbanos. Já a análise de Almeida e Silva (2021) aponta que, embora Santarém tenha um índice médio de 90,09 m² de área verde por habitante, a maior parte dessas áreas está concentrada na periferia, deixando o centro cada vez mais desprovido de cobertura vegetal. Preservar e valorizar áreas como o campus Tapajós é, portanto, essencial não apenas para a saúde ambiental da cidade, mas também para sua memória, sua resiliência climática e seu direito ao futuro.
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Os Arboristas 22a8
A iniciativa, batizada de Os Arboristas, é coordenada pela professora Dra. Juliana Mendes de Oliveira e integra o Programa de Inovação Institucional e Atuação Profissional Empreendedora (PIAPE 2024), com apoio da SINFRA/UFOPA.
Os Arboristas e professora Juliana Mendes de Oliveira
Mais do que um exercício técnico, o trabalho dos Arboristas foi um gesto de cuidado com a cidade. Agora, a ação entra em uma nova fase: a criação de um viveiro de espécies nativas. O objetivo é expandir a arborização do campus e distribuir mudas para a população de Santarém. É um convite à cidadania verde. Plantar árvores hoje para colher sombra, ar puro e justiça ambiental amanhã.
O levantamento foi conduzido por estudantes do 7º período de Engenharia Florestal, sob a liderança de Raimundo Nonato Caetano Serrão, estudante do 9º período e técnico florestal com ampla experiência em campo. Desde 2017, Raimundo atua como responsável pela cartografia na Coomflona — a Cooperativa Mista da Floresta Nacional do Tapajós — que reúne comunitários da região em atividades de manejo florestal sustentável.
PATRÍCIA KALIL para Envolverde, direto do coração da Amazônia.
Toda semana, a jornalista e estudante de Engenharia Florestal Patrícia Kalil escreve de Santarém (PA)