Memória de Santarém: Dicionário do Baixo-Amazonas 175x3o
Saburá, espécie de breu extraído do cortiço das abelhas; Apanacu: cesto de palha preta, usado para carregar mandioca, batata, cará e outros produtos locais -
Créditos: Reprodução
Durante algum tempo recolhi material para escrever um dicionário sobre o mundo rural de Santarém. Incluiria as expressões típicas da região, aplicadas às suas atividades rotineiras, às suas crendices, ao folclore e à sua relação com o mundo externo. A fonte principal da pesquisa eram os cadernos de anotação e os trabalhos realizados pelos alunos das escolas do Movimento de Educação de Base, o MEB, nas décadas de 1960/70.
O o a essa fonte me foi facilitado por Ieda Campos, minha prima (infelizmente, já falecida), que foi professora do MEB durante muitos anos. Uma versão preliminar chegou a ficar pronta, mas acabou se perdendo acidentalmente. Vou aproveitar estas memórias para ir compondo gradualmente esse dicionário. Talvez resulte algo útil e interessante.
Estas primeiras expressões foram coletadas junto à comunidade do Piquiatuba, no rio Tapajós. É possível que haja expressões típicas de determinadas comunidades ou adquiram em uma delas significado diverso do que tem em outra comunidade. A referência ao local visa identificar culturas específicas e revelar a diversidade cultural do Baixo-Amazonas. Certos verbetes também mostram as adaptações e recriações da população local a partir do uso de objetos ou tecnologia de fora. Procurei manter ao máximo a linguagem original, reproduzindo a forma de expressão entre os moradores.
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APANACU (ou picuá) – Cesto de palha preta, usado para carregar mandioca, batata, cará e outros produtos locais.
CABEÇA DE GALO – Bebida feita de conserva com limão, farinha, alho e um pouco de água. Serve como merenda do homem no roçado.
CAÇA DE VEADO – Encontrando uma fruteira da qual o veado se utiliza na sua alimentação, o caçador monta uma rede em torno da árvore e espera o aparecimento do animal, principalmente entre nove horas da noite e uma da madrugada.
CACURI – Cerca montada dentro da água do igarapé, feita de tala da palha curuá, para pegar peixe.
CAMAROEIRA – Armadilha feita de tala de inajá para pegar camarão, que é atraído pela casca da mandioca, usada como isca dentro da armadilha.
CAMBÃO – Pedaço de pau ao qual os cães bravos são atados por corda.
CAPOTE – Tecido feito da palha curuá que é colocado na cumeeira da casa.
CARURÁ – Pequeno forno de barro.
CASSUÁ – Utensílio usado para transportar carga nas costas dos animais.
CAXARÁ – A mandioca é ralada, espremida, torrada, misturada com batata e água, transformando-se numa bebida, que é tomada nos roçados e também nas festas.
CHAFARIZ – Os nativos usavam como fonte de água, no meio da mata, um cipó de ambé. Cortado no comprimento de três metros, fornece água para encher uma lata de querosene. Recebe o nome de chafariz.
COIÔ – Cuia feita de cabaça.
ESTEIRA (ou tupé) – Feita da tala de caraná, palmeira que dá nas margens dos igarapés. É trançada com tala de jacitara.
IRAPUCA (o mesmo que Juçana) – Armadilha com isca, usada para pegar juriti. É feita com talas de bambu amarradas com envira, uma fibra extraída da manguiana.
JACUMÃ – Leme que guia as embarcações na cachoeira.
JAPÁ – Tecido feito da palha curuá, usado para fechar as portas das casas.
MANICUERA – Espécie de bebida, feita de mandioca manicuera. Ela é ralada para se extrair o tucupi, que é fervido, primeiro só, depois com cará, batata e arroz, tudo junto. É servido frio.
MASSARANDUBA – Derruba-se a árvore e se limpa ao redor dela. Anela-se o tronco até que saia o leite, recolhendo-se o líquido com uma colher e colocando-o na lata. Ao chegar ao barraco, coloca-se o conteúdo da lata para ferver. Depois de apurado, derrama-se por cima de uma tábua para amassar, enrola-se e está formada a borracha de massaranduba.
MOLONGÓ – Colher de pau para mexer mingau.
PANEIRO (ou aturá) – Feito com o cipó ambé, que é tecido com dois palmos de altura. Serve para carregar mandioca, batata e cará.
PATRONA – Depósito no meio da mata para guardar cartucho, chumbo e espoleta.
PENEIRA – Feita de talas da palmeira arunã, formando uma tela, que é amarrada num quadrado com oito varas da mesma tala. Serve para amassar farinha.
PILÃO – Uma espécie de moinho, usado para triturar café, milho, etc. Corta-se um pedaço de pau, chamado sapupira, com um ferro, chamado goivete. Com fogo, abre-se o centro da madeira, na profundidade desejada. A mão do pilão é tirada de outro pedaço de madeira, com quatro palmos de comprimento.
POLVARINHO – Objeto feito com chifre de boi para guardar pólvora e chumbo.
PUBERO – Pequena cerca de madeira construída na margem do rio ou igarapé para que nela a mandioca amoleça.
RAMAL – Caminho feito na mata. Deve ser mantido bem varrido, sem as folhas, para que, à noite, o caçador possa sair atrás de animais para matar, como o tatu, a paca e o veado.
RAPADOR – Pedaço pequeno de ferro que é engatado na ponta de uma vara. Serve para raspar as seringueiras.
RODO – Tábua com um palmo de comprimento por meio palmo de largura. O centro é furado e através dele se coloca outro pedaço de pau, com dois metros de comprimento. Serve para mexer farinha.
SABURÁ – Espécie de breu extraído do cortiço das abelhas.
TABULETA – Pedaço de pau com um palmo de tamanho. Serve para enrolar linha de pescaria.
TAPUÁ – Arpão usado para fisgar tracajá quando ele sobre nos troncos que flutuam na superfície da água.
TIPITI – Espremedor de mandioca para fazer farinha, confeccionado com tala de bacabeira.
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